Antonio Carlos Egypto
O
COMPROMISSO DE HASAN
é o novo trabalho do grande diretor turco Semih Kaplanoglu, de “Um Doce Olhar”,
“Ovo”, “Leite” e “Grão”, todos ótimos filmes.
Aqui, o universo rural e de natureza é registrado por uma fotografia com
cores vibrantes, sem exageros, que ressalta uma vez mais a exuberante beleza do
lugar e das paisagens turcas. A história
relatada explora um dilema moral, em que está envolvido Hasan, quando uma rede
de transmissão elétrica, com grandes transformadores, está para ser implantada
no meio do terreno onde ele ganha a vida como agricultor. As atitudes que ele tomará a partir daí vão
colocar em xeque sua visão do mundo, seus valores muçulmanos e, claro, a sua
própria consciência, antes de tudo. Há
coisas que são capazes de transformar uma vida, certos desafios tocam fundo no
psiquismo humano. Belíssimo filme, que
tem no elenco Umut Karadag, Filiz Bozok, Gökhan Azlag, Ayse Günyüz. 147 min.
Já que estou falando da Turquia,
registro também um ótimo trabalho de um novo diretor, Erkan Yazici. Em seu primeiro longa, TERRA DISTANTE, a trama vai à costa do mar Negro, em 1925, quando
ocorria uma troca de cidadãos entre a Turquia e a Grécia, por um acordo entre
os dois países. Nessa troca, um menino
que se perde da família, que embarcou sem ele, e um oficial turco que está
degredado se encontram isolados numa ilha.
Têm de conviver entre si enquanto não vem o barco que resgatará o
menino. Um confronto, mesclado por uma
relação simbolicamente paterna, dá origem a um filme muito interessante e bem
realizado. No elenco, Haydar Sisman,
Abdurrah Gonian, Orkun Serialoglu. 93
min.
A
NOITE DO FOGO, do
México, da diretora Tatiana Huenzo, em seu primeiro longa, é uma das pérolas
dessa edição da Mostra. O filme retrata
uma aldeia numa paisagem montanhosa em que seus habitantes, especialmente as
mulheres, estão oprimidos entre os traficantes, para quem trabalham no cultivo
da papoula, e da polícia, por quem são extorquidos. Até o professor da pequena escola da aldeia,
que veio de fora, não consegue trabalhar porque tem de pagar para isso. A questão feminina aqui se destaca, já que a
prática de sequestro de meninas e, principalmente, de mulheres jovens, as
obriga a viverem se escondendo em esconderijos subterrâneos, usando cortes de
cabelo masculinos e muitos outros cuidados.
Todas estão em perigo na iminência de terem de sumir às pressas
dali. O filme consegue explorar bem o
medo e a expectativa que estão sempre no ar, valendo-se de locações atraentes
que o embelezam, um respiro para a tragédia que exibe. No elenco Ana Cristina Ordóñez Gonzáles,
Marya Membreho, Mayra Batalla. 110 min.
Do Japão vem um dos melhores filmes da
Mostra 45, RODA DO DESTINO (A Guzen to Sozo), de Ryusuke Hamaguchi
(de “Asako I e II”). Composto por três
histórias distintas, que envolvem a vida de mulheres em encontros em que a
complexidade das relações humanas e amorosas é evidenciada. Tudo acontece, aparentemente, por acaso. Ou por obra do destino. E se dá de uma forma poética, por meio da palavra. É um filme de erotismo verbal. O sexo valorizado pela linguagem literária,
ou por expressivo relato de encontro amoroso.
Ou, ainda, pela memória do passado, que vem novamente à tona. Numa das narrativas, predomina o triângulo
amoroso que irrompe de modo inesperado, cheio de sensualidade. Em outra, uma aluna tenta seduzir seu mestre,
lendo em voz alta um trecho erótico do romance que ele escreveu. E isso se dá de porta aberta. Na última história, o encontro casual de duas
mulheres acontece ao se reconhecerem cruzando uma escada rolante. Uma longa e profunda conversa vai se dar
quando uma vai à casa da outra e descobertas fundamentais virão daí. Simplesmente encantador em sua aparente
simplicidade. E extremamente cativante e
eficiente nas três diferentes situações, uma melhor do que a outra. No elenco, Kotone Furukawa, Kiyoshiko
Shibukawa, Katsuri Mori, Fusako Urabe.
121 min.
Também é importante destacar o
curta-metragem, de 30 minutos, de Pedro Almodóvar, da Espanha, falado em
inglês, pela primeira vez no caso do diretor: A VOZ HUMANA. A grande atriz britânica Tilda Swinton atuando
sozinha, falando ao telefone com o ex-amante que a deixou, interagindo com o
cachorro dele que ficou e às voltas com as malas dele, ou numa cena rápida,
comprando um machado numa loja. Ela dá
um banho de interpretação nesse pequeno filme que adapta livremente a peça
homônima de Jean Cocteau (1889-1963). Toque de mestre, como de costume.
@mostrasp
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