quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

UMA MULHER ALTA

Antonio Carlos Egypto





UMA MULHER ALTA (Dylda).  Rússia, 2019.  Direção: Kantemir Balagov.  Com Viktoria Miroshnichenko, Vasiliva Perelygina, Andrey Bykov, Igor Shirokov.  137 min.


“Uma Mulher Alta” é um drama humano que remete a questões femininas, como a reprodução, num contexto de guerra, em que as mulheres estão mutiladas, abaladas psicologicamente, sofrendo as consequências do conflito que recém terminou.  No caso, trata-se de Leningrado (hoje, São Petersburgo), em 1945, com o final da Segunda Guerra Mundial, em que a cidade sofreu um dos piores cercos da história.

O olhar do filme, inspirado no livro “A Guerra não Tem Rosto de Mulher”, de Svetlana Aleksiévitch, é justamente sobre as consequências que a guerra deixa na vida e no corpo das mulheres.  Um enfoque de gênero muito apropriado, já que o que conhecemos mais é o efeito bélico que destrói os homens, sempre vistos como protagonistas, os principais atores da trama.

No evento abordado em “Uma Mulher Alta” reconhece-se também uma situação que envolveu mais intensamente as mulheres no contexto de guerra na resistência russa.




As personagens que representam essas mulheres são Iya (Viktoria Miroshnichenko), a grandona desajeitada que inspira o título brasileiro, e Masha (Vasilisa Perelygina).  Figuras heroicas pelo que fizeram e continuam fazendo pelos mutilados e mutiladas de guerra, como elas próprias.  Tentam reconstruir suas vidas, como todos, mas esbarram em barreiras pessoais que remetem de forma direta à guerra que tiveram de vivenciar.  E, ao tentarem se desvencilhar ou contornar suas limitações, acabam por gerar novos dramas e problemas, ao invés de superá-los ou vencê-los.

Tudo isso é mostrado numa narrativa que enfatiza os sentimentos, a frustração e o desespero, em especial, numa caracterização de época feita com muito cuidado e delicadeza. A paleta de cores em que dominam o verde e o ocre dá destaque a esse drama e o calor dos sentimentos.  Os veículos e os objetos de cena são em grande parte autênticos da época, cedidos por museus, como o dos transportes.  As recriações e o figurino procuram respeitar com fidelidade os ambientes e as pessoas, sem exagerar no sentido passadista.  Há uma intenção de tomar aquele momento e situação passados como fontes de reflexão para o presente, em sintonia com uma visão feminista atual.

Duas ótimas jovens atrizes protagonizam o trabalho, oferecendo força e consistência psicológica a suas personagens.  Os homens e as outras mulheres com quem elas contracenam complementam e valorizam esse bom desempenho de Viktoria Miroshnichenko e Vasilisa Perelygina.

O diretor, Kantemir Balagov, em seu segundo longa, após “Tesnota”, de 2017, realiza um trabalho com a câmera que produz envolvimento e tensão, enquadramentos que nos aproximam da personalidade daquelas mulheres e nos põem dentro do forte drama que elas vivem.

“Uma Mulher Alta” é a indicação russa para concorrer ao Oscar de filme internacional, já passou por vários festivais internacionais, tendo alcançado premiações em Cannes: melhor direção e prêmio da Crítica do Un Certain Regard, e também em Genebra, Montreal e Estocolmo




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