Antonio Carlos
Egypto
O cinema italiano tem de enfrentar, queira ou
não, o fantasma de um passado tão glorioso que jamais conseguirá igualar. Mas, a julgar por alguns filmes exibidos na
mostra 8½. Festa do Cinema Italiano,
que entrarão em cartaz nos cinemas brevemente, o nível da produção atual é bem
bom. São realizações de muito bom nível,
com alta qualidade de produção, cineastas competentes, elencos em que abundam
talentos e histórias que exploram o mistério e o ambíguo em diferentes gêneros
cinematográficos.
UMA QUESTÃO PESSOAL (Una questione privata), dos irmãos Paolo e Vittorio Taviani, de
2017, é um filme simples e bonito.
Passa-se no Piemonte, em 1943, envolvendo dois participantes da
Resistência Italiana, na Segunda Guerra Mundial. Eles se alistam e lutam contra os fascistas,
mas têm em comum, além disso, o desejo por uma mulher, Fúlvia. Estamos no clima de guerra, porém, o filme
não destaca o lado político dela.
Milton, em meio à guerra, procura por seu amigo e rival, Giorgio, que
caiu nas mãos dos fascistas, mas suas razões são de ordem pessoal, como diz o
título do filme. É um trabalho para se curtir com calma, apreciando a beleza do
lugar, a filmagem elegante, o desempenho do elenco. Tem a chancela desses
fabulosos irmãos cineastas, que sempre trabalharam juntos e assim continuaram,
Paolo, com 86 anos, e Vittorio, falecido em abril de 2018, aos 88 anos. Com
Luca Marinelli, Valentina Bellè, Lorenzo Richelmy. 84 minutos.
FORTUNATA (Fortunata), de Sergio Castellitto, de 2017, é um filme intenso, que
foca na vida atormentada da personagem central, Fortunata, cabeleireira a
domicílio, em busca de conquistar sua independência, abrindo seu próprio
salão. Nisso está muito antenada com os
tempos atuais do capitalismo, que enxerga no empreendedorismo a solução para os
seus males: as perdas de direitos trabalhistas, de emprego e de renda. A luta da personagem passa tanto pelas
dificuldades concretas do dia-a-dia, que incluem uma filha de 8 anos e um
casamento fracassado, numa vida difícil, bastante representativa do nosso tempo,
quanto por questões existenciais. Um processo psicoterápico que entra na trama
acentua ainda mais o drama. Jasmine Trinca, que vive Fortunata, venceu o prêmio
de melhor atriz em Cannes. Com Jasmine
Trinca, Stefano Accorsi, Alessandro Borghi, Edoardo Pesce. 103 min.
A
GAROTA NA NÉVOA (La
Ragazza Nella Nebbia), de Donato Carrisi, de 2016, é um suspense policial
muito bem realizado, em locações belíssimas e com um grande e competente
elenco. O diretor é o próprio escritor
do romance policial que deu origem ao filme, o que garante um roteiro
intrigante e que prende o espectador do início ao fim. Explorando o mistério do
desaparecimento de uma adolescente, recatada e religiosa, em um povoado do
norte da Itália, o filme caminha no sentido de produzir um culpado, a partir
dos métodos incriminatórios nada convencionais do investigador policial. Ele está mais interessado em atender à mídia
e em se projetar do que investigar, de fato.
Em seu passado, já incriminou um inocente, sem ter qualquer remorso na
consciência. A névoa pontua e acentua o
clima de mistério, num filme pictoricamente muito atraente. Com Toni Servillo, Jean Reno, Alessio Boni,
Galatea Ranzi. 127 min.
POBRES,
MAS RICOS (Poveri ma
Ricchi), de Fausto Brizzi, de 2016, é uma comédia rasgada, de fato muito
engraçada. Explora um tema banal, o de
uma família humilde, de um pequeno povoado, da região de Lazio, que ganha na
loteria e se torna bilionária da noite para o dia. Para escapar do possível assédio local vai
viver em Milão uma vida de luxo, tentando ficar incógnita em relação à sua
comunidade. E, como seria de se esperar,
não têm ideia de como se comportar enquanto ricos. Ou melhor, a ideia que têm está ultrapassada. Os ricos atuais são diferentes dos do
passado, mudaram seus comportamentos. O
que torna tudo ainda mais difícil.
Comédia que explora os costumes e comportamentos típicos do povo, com
diálogos espirituosos e escorada num ótimo elenco de atores cômicos. Sem apelações nem grossura. Brinca com os
clichês de um jeito inteligente, evitando o desrespeito e o preconceito. Humor de qualidade que faz jus à grande
tradição da comédia italiana. Sucesso de
público, que já gerou uma continuação na Itália: Poveri Ma Ricchissimi. Com
Christian De Sica, Enrico Brignano, Lucia Ocone. 90 min.
Nenhum comentário:
Postar um comentário