Antonio Carlos
Egypto
A MORTE DE LUÍS XIV (La Mort de Louis XIV).
França, 2016. Direção: Albert
Serra. Com Jean-Pierre Léaud, Patrick
d’Assumçao, Marc Susini, Irene Silvagni.
105 min.
Os últimos dias de Luís XIV (1638-1715), o rei Sol,
não foram alegres, iluminados ou ostentatórios.
Foram deprimentes. Mas como
poderia deixar de ser deprimente a agonia da morte? Principalmente numa época em que a medicina
sabia muito pouco, quase nada, sobre o corpo humano e tudo se esvaía sem
esperança.
O filme do cineasta catalão Albert Serra, “A Morte de
Luís XIV”, procura reconstruir os momentos finais da vida de um rei que marcou
enormemente a história da França, num reinado de 72 anos.
Tudo começa com uma dor na perna, depois de uma
caminhada. A partir daí, a febre, a
fraqueza, a inapetência e o sono intranquilo, vão nos mostrando a agonia do
monarca, cercado por seus serviçais, fiéis seguidores e médicos, que pouco
sabiam fazer além das tradicionais sangrias.
O quadro evolui para uma gangrena fatal.
Acompanhamos todos esse processo, passo a passo, no
leito de morte real. É duro, traz
desconforto ao espectador, mas é muito realista. Vale para todo mundo, não só para as figuras
reais, ou famosas. Estar cercado de
pessoas e cuidados, como o filme mostra, acaba ajudando pouco, porque as
agruras da morte têm de ser enfrentadas por cada um consigo mesmo.
A pessoa responde ao desafio da morte com suas
características próprias e as das doenças que adquiriu. As dores variam, os cuidados, também. Melhor para quem tem processos rápidos,
fulminantes. Não foi o caso de Luís XIV,
que sofreu, irremediavelmente, em função dos parcos recursos de seu tempo,
mesmo sendo o que teve acesso a tudo o que era possível na época.
O grande ator Jean-Pierre Léaud, que conhecemos desde
menino, em função dos filmes de François Truffaut (1932-1984), que ele
protagonizou com brilhantismo em várias fases da vida, tem agora a oportunidade
de novo grande desempenho no ocaso da vida do rei Sol, aos 77 anos de idade.
Vê-lo sofrer o tempo todo do filme, nesse papel,
incomoda. Desejaríamos tanto ao
rei, quanto ao ator, que é muito exigido
nessa atuação, melhor sorte. Ou, quem
sabe, é do espelho da nossa morte que se trata.
O cineasta Ingmar Bergman (1918-2007) dizia com todas as letras que
tinha muito medo da morte, não exatamente de morrer, mas da agonia que a morte
pode trazer. A julgar pelo filme “A
Morte de Luís XIV”, o rei Sol não foi poupado dessa exasperante agonia.
Albert Serra dirigiu e roteirizou com Terry Lounas
uma obra detalhista e desconcertante sobre o fim da vida, tirando o espectador
da zona de conforto. É muito pesado, mas
é um belo trabalho cinematográfico.
Aproveito para lembrar que o filme de Roberto
Rossellini (1906-1977) “A Tomada do Poder por Luís 14”, de 1966, que retrata a
ascensão do rei, foi relançado recentemente na coleção da Folha, “Grandes
Biografias no Cinema”, concebida e coordenada pelo crítico Cássio Starling
Carlos, o livro-DVD ainda pode ser encontrado nas bancas de jornais.
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