Antonio
Carlos Egypto
TIMBUKTU (Timbuktu). Mauritânia, França, 2014. Direção: Abderrahmane Sissako. Com Ibrahim Ahmed aka Pino, Toulou Kiki, Abel
Jafri. 97 min.
“Timbuktu” é um dos cinco finalistas na disputa pelo Oscar
de filme estrangeiro. Representante da
Mauritânia, país norte-africano que faz fronteira com o Marrocos, é um trabalho
que impacta, tanto pela forma, quanto pelo conteúdo.
Para começar, pela belíssima fotografia que explora a
vastidão das tonalidades de bege da região desértica onde se situa a ação. A
areia levantada pelo vento, os deslocamentos dos veículos e das pessoas, o sol
que reflete, a noite que desce e produz belas silhuetas, o rio que corre e se
compõe com a paisagem arenosa e a pequena aldeia com suas tendas e habitações
pobres formam um cenário sedutor, que é muito bem esquadrinhado por câmeras que
penetram por todos os espaços. Os
enquadramentos são magníficos. O plano
geral que culmina com uma morte em consequência de uma briga no rio é, talvez,
o mais deslumbrante momento de “Timbuktu”.
É muita beleza para tanta pobreza e sofrimento. Mas quem gosta de cinema não vai deixar de
apreciar tudo isso na tela grande e insubstituível das salas de cinema, quando
se vê um filme como esse.
O cineasta
Abderrahmane Sissako é um esteta talentoso e ousado e sua coragem para abordar
a realidade que escolheu tratar não fica atrás.
O filme mostra, por meio de diferentes personagens, o que significa para
a pequena localidade de Timbuktu, no norte do Mali, a ocupação da aldeia por
islâmicos radicais.
O fundamentalismo religioso determinando ações já tem
demonstrado fortemente que resulta em tragédia.
Aqui, a ênfase maior está no sofrimento cotidiano, surdo e opressor, que
também produz tragédias, mas que antes expulsa uma população que foge para não
ter que suportar barbaridades que inviabilizam seu dia-a-dia. Como as proibições de música e futebol, além
de bebida e de fumo. As mulheres, além
de terem de cobrir a cabeça com véus, são forçadas a usar luvas e vestir meias
para tudo. O convívio conjugal sem
casamento religioso é punido enterrando-se os “pecaminosos” até a cabeça e
matando-os por apedrejamento. Todas essas coisas, de uma violência ímpar, são
impostas sem maiores exteriorizações, em tom baixo, aparentemente religioso,
mas sem direito ao perdão e sem piedade.
Julga-se e mata-se em nome de Alá, do Profeta, de Deus. A justiça e a polícia islâmica ali retratadas
são implacáveis.
Quando se aplicam chibatadas para os pecados mais
leves, o grito se impõe. Como suportar
tanta injustiça? Mas também há lugar
para a rebeldia juvenil: uma das boas cenas do filme é o jogo de futebol
praticado pelos meninos sem bola. Sensacional!
O diretor não deixa dúvidas quanto ao que ele quer
denunciar e quanto à sua posição sobre o fundamentalismo religioso que viceja
na sua região e se espalha pelo mundo. E
o tão belo e artístico “Timbuktu” não deixa de ser um filme de horror. Triste e muito realista.
O filme da Mauritânia tem todos os méritos para estar
na disputa pelo Oscar de filme de língua não-inglesa. É difícil que seja o escolhido. Mas ter chegado à disputa final já lhe deu
uma visibilidade importante e merecida.
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