quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

VÍCIO FRENÉTICO




Antonio Carlos Egypto



VÍCIO FRENÉTICO (Bad Lieutenant: Port Of Call New Orleans).Estados Unidos,2009. Direção: Werner Herzog. Com Nicolas Cage, Eva Mendes, Val Kilmer e Jennifer Coolidge. 121 min.

Werner Herzog é um dos grandes diretores do chamado novo cinema alemão, ao lado de Rainer Werner Fasbinder, Volker Schlondorff e Wim Wenders. Fez filmes notáveis que ficaram para a história do cinema e que merecem ser vistos e revistos, como “Aguirre, a cólera dos deuses” (1972), “O enigma de Kaspar Hauser” (1974), “Fitzcarraldo” (1982) ou “O meu melhor inimigo” (1999). Quem viu esses ou outros filmes do diretor e conhece o seu trabalho não pode ser indiferente a um novo filme do realizador.

Este novo trabalho, de 2009, é “Vício Frenético”, filme policial, produção hollywoodiana, que tem como protagonista um detetive impulsivo, o que se demonstra já no início, quando ele pula na água suja, todo vestido, para resgatar um bandido. Além de impulsivo, ele é também autoritário, arrogante e onipotente, do gênero que paira sobre a própria lei, que ele deveria garantir e respeitar, e para quem nada vai acontecer. Só que ele adquiriu fortes dores que exigem uso de analgésicos constantemente. Por outro lado, ele passa a vida em contato com traficantes, drogas e tudo o que gira em torno disso, como roubos, agressões, assassinatos.

A linha que separa o homem da lei do transgressor é tênue e o policial, vivido por Nicolas Cage, transita o tempo todo pelos dois lados. Drogas psicoativas podem ser poderosos analgésicos. Extorsão, chantagem, intimidação e prostituição são coisas habituais na rotina policial. Juntar esses elementos, explorar os conflitos, colocar ação no drama com belos enquadramentos e movimentos de câmera é conseguir, é claro, um bom divertimento cinematográfico.

Mas quem é mesmo o diretor? Werner Herzog? Aquele mesmo que sempre buscou entender e questionar o inusitado, aquilo que desafia a compreensão, o que incomoda? Um cineasta que fez da reflexão a razão de ser do seu cinema se dedica a um projeto como esse? Estranho, para dizer o mínimo.

É evidente que o policial em questão, também vivendo no fio da navalha, nos coloca a situação dos limites humanos, até onde se pode ir, que domínio se pode ter das coisas e de si mesmo. E ainda que as circunstâncias da vida possam favorecer o personagem, ele afunda no lodo, como o bandido da cena inicial, até poder sair dele, e não exatamente por seus méritos. Condecorações podem ser uma piada, por que levá-las a sério? Isso também está no filme. Mas é muito pouco para um cineasta do porte de Herzog.

“Vício Frenético” é muito mais Hollywood que Herzog, como que atualizando a crença de que a indústria norte-americana do cinema é capaz de enquadrar qualquer talento. Até Ingmar Bergman se deu mal quando trabalhou por lá. Felini sobreviveu intacto, sendo oscarizado e reverenciado pelo cinema americano. Almodóvar também, pelo menos até agora. Melhor para eles.

De qualquer modo, quem for ver “Vício Frenético”, sem buscar comparações com outros filmes de Herzog, vai se divertir e se colocar algumas questões. Já é alguma coisa.

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