terça-feira, 30 de abril de 2013

SOMOS TÃO JOVENS

                          
Antonio Carlos Egypto




SOMOS TÃO JOVENS.  Brasil, 2012.  Direção: Antonio Carlos Fontoura.  Com Thiago Mendonça, Laila Zaid, Bianca Comparato, Bruno Torres, Olívia Torres, Daniel Passi, Sérgio Dalcin, Sandra Corveloni, Marcos Breda.  104 min.


Renato Russo (1960-1996), cantor e compositor, foi um dos grandes nomes do rock brasileiro.  “Somos Tão Jovens” é uma cinebiografia do artista, centrada em seis anos de sua vida em Brasília.  Nesse período, ele constrói sua carreira musical, formando a banda de punk rock “Aborto Elétrico”, que depois se dissolveria.  Ele teria um período de atuações-solo, em busca de novos rumos melódicos e poéticos, e chegaria à banda “Legião Urbana”, que alcançou grande sucesso.  Da divisão do “Aborto Elétrico” resultou também a banda “Capital Inicial” que, igualmente, obteve muito êxito.



“Somos Tão Jovens” é um filme de ficção sobre a vida de Renato Russo, a partir de uma biografia autorizada.  Caracteriza o personagem por meio de algumas cenas que mostram a personalidade e fatos marcantes vividos no período, mas sem se deter muito na história de vida.  A epifisiólise que o acometeu, deixando-o por dois anos entre uma cama e a dependência de uma cadeira de rodas para se locomover, aparece de forma discreta, assim como sua bissexualidade.  E não há referências ao HIV, que viria mais tarde comprometer sua vida.  O uso de álcool e outras drogas é mostrado, sem maiores repercussões, no conjunto da vida ou da obra.

O filme está muito mais preocupado em mostrar como sua música evoluiu.  Acaba fazendo um musical, em que o rock reina soberano e que vai agradar aos fãs do gênero.  Para isso, contou com performances gravadas ao vivo, com Thiago Mendonça no papel de Renato Russo, mostrando excelente desempenho, tanto na música como na atuação e na caracterização do personagem.  Aliás, a semelhança com o original é bem acentuada.  O desempenho dos atores/músicos que o acompanham nas apresentações é muito bom.  Isso dá força a essa ficção, que respira rock por todos os poros.



A direção musical do filme ficou a cargo de Carlos Trilha, que também produziu discos do “Legião Urbana” e conhecia bem Renato Russo.  O contato com o pessoal do rock de Brasília, que se destacou nos anos 1980, deve ter contribuído para criar todo o clima que “Somos Tão Jovens” procura enfatizar.



Era o tempo final da ditadura e Renato era um roqueiro politizado, que fez de sua poesia também uma peça de resistência.  Seu trabalho permanece sendo conhecido, respeitado e consumido pelo talento que revelou.  Nos 36 anos que viveu, Renato Russo e o “Legião Urbana” deixaram sua marca.  O filme de Antonio Carlos Fontoura funciona como um registro e uma homenagem a esse rock que começou muito barulhento e terminou muito mais melódico e poético.  E sempre crítico, inconformado, contestador.



quinta-feira, 25 de abril de 2013

O ABISMO PRATEADO

                                 
Antonio Carlos Egypto




O ABISMO PRATEADOBrasil, 2011.  Direção: Karim Aïnouz.  Com Alessandra Negrini, Thiago Martins, Gabriela Pereira, Carla Ribas, Alice Borges.  83 min.


Quando você me deixou, meu bem,
Me disse pra ser feliz e passar bem.
Quis morrer de ciúme, quase enlouqueci,
Mas, depois, como era de costume,
Obedeci.

Esses versos fazem parte da canção “Olhos nos Olhos”, de Chico Buarque, inspiração confessa do diretor cearense Karim Aïnouz para seu novo trabalho, “O Abismo Prateado”.




A letra da canção começa, como se pode ver acima, tratando da perda e da desestabilização provocadas por um rompimento inesperado e unilateral, numa relação amorosa.  Quem partiu foi o homem, quem expressa o sentimento na poesia é a mulher.  Ou seja, o chão se abre para uma mulher que foi abandonada, sem esperar ou estar preparada para isso.  Se seguirmos na letra da canção, veremos que Chico Buarque expressa a virada dessa mulher, sua vingança e controle da situação.  Por exemplo, em frases como estas: Quero ver como suporta me ver tão feliz.  E que venho até remoçando, me pego cantando, sem mais nem porquê.




O filme “O Abismo Prateado”, no entanto, retrata a primeira parte da história: o desespero da perda, o enlouquecimento, a busca do ser amado, o vagar desencontrado, para só no final vislumbrar a superação.  É o abismo o que se mostra na vida de Violeta (Alessandra Negrini), uma dentista de 40 anos, aparentemente bem casada e feliz, com um filho adolescente, vivendo em um novo apartamento em Copacabana.  E que recebe a notícia da separação num recado pelo celular, o que dá margem à experiência dolorosa que é o assunto do filme. 

Um trabalho cinematográfico simples e belo.  Desde as primeiras imagens, focalizando o mar, intenso e revolto, mas admiravelmente sedutor.  Até o desenrolar do sofrimento feminino, que se lê nas expressões faciais e corporais de Alessandra Negrini, nos espaços e ambientes por onde ela transita, nas pessoas com quem interage.  Vivemos o que ela vive, nos perdemos junto com ela, a perplexidade toma conta de tudo.  Até que algo possa renascer e redirecionar a vida.

Se “Olhos nos Olhos” põe o foco na libertação feminina, o filme de Karim Aïnouz fica no abismo que a antecede.  Sinal de que haveria espaço até para um segundo filme, inspirado na mesma música.  Esse acabaria sendo uma elegia feminista, como de fato é a belíssima canção de Chico Buarque.



O cineasta Karim Aïnouz já nos deu filmes muito bons, como “Madame Satã”, de 2002, “O Céu de Suely”, de 2006, e “Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo”, esse último de 2009, em parceria com Marcelo Gomes.  Foi roteirista de tantos outros trabalhos importantes, como “Cinema, Aspirinas e Urubus”, de 2004, e “Cidade Baixa”, de 2005.  É um dos grandes nomes do cinema brasileiro da atualidade.  “O Abismo Prateado” é uma pérola romântica que enriquece ainda mais essa filmografia.



domingo, 21 de abril de 2013

GINGER & ROSA

                                     
 Antonio Carlos Egypto


GINGER & ROSA (Ginger & Rosa).  Inglaterra, 2012.  Direção: Sally Potter.  Com Elle Fanning, Alice Englert, Alessandro Viola, Christina Hendricks, Thimothy Spall, Anette Bening.  90 min.




Londres, 1962.  No pós-guerra britânico, convivem a Guerra Fria, com a ameaça muito concreta de uma hecatombe nuclear que poria fim à vida na terra, com um mundo de mudanças nos comportamentos.  O advento da pílula anticoncepcional, a liberdade sexual dela decorrente, transformações efetivas no papel das mulheres na sociedade.  O advento da contracultura: paz e amor será o lema da era hippie.  Uma década de grandes mudanças e muito medo.

Nesse contexto, duas garotas adolescentes, inseparáveis, são não só as melhores amigas, mas amigas para sempre, como se definem.  Nisso, nada de novo.  Esse é um elemento conhecido e tradicional dos relacionamentos entre meninas e moças.  Só que já não será possível algo tão intimista e exclusivo nessa amizade, uma vez que o mundo exige tomada de posições.  A crise dos mísseis de Cuba naquele 1962 é um exemplo.  A alienação é inaceitável.  Vai daí que um programa obrigatório de ambas serão as passeatas e panfletos de protesto contra as armas nucleares e a militância pelo pacifismo.




Ginger, a ótima Elle Fanning, admira o pai, Roland (Alessandro Viola), pelo seu jeito anárquico e pacifista, um adulto em plena conexão com a sua época.  Já não sente o mesmo por sua mãe, Nathalie (Christina Hendricks), que ainda não deu o salto para a  liberdade que se abria à vida das mulheres daquele período revolucionário.  Enquanto isso, a sexualidade aflora e as descobertas amorosas estão na ordem do dia.  E o pai descolado de Ginger vai interessar muito a Rosa (Alice Englert), a melhor amiga dela.  É em torno dessa narrativa que decorre a maior parte do filme.




Nada de tão especial, a não ser pela caracterização da época.  “Ginger & Rosa” é muito feliz, ao nos transportar para aquele período, em suas características essenciais.  Casas, roupas, objetos, a vida na rua, os comportamentos, as preocupações, as expressões, as comunicações, a propaganda, tudo nos remete àquela data. Viver naquele momento da vida, não só na Inglaterra, mas em boa parte do mundo, tinha implicações sociais evidentes, que em tudo se manifestavam.  Havia um sentido de coletividade, que alcançava todos, de uma forma ou de outra.  Isso o filme mostra muito bem.  Assim como a dicotomia liberdade e medo.  O tom escuro, londrino, como que enfatiza o medo.  Justo agora, que podemos ser livres, o mundo pode acabar a qualquer momento, parecia ser o pensamento dos jovens.




O que se verá, também, é que essa nova liberdade não é assim tão simples de ser vivida.  Encanta, por um lado, mas faz sofrer, por outro.  Na vida pessoal pode ser bem complicado administrar tudo isso.

“Ginger & Rosa” é, obviamente, nostálgico.  E certamente histórico.  Permite um olhar para um passado recentíssimo, muito rico de vivências e possibilidades que moldaram muitos dos avanços de que desfrutamos atualmente.  Também nos permite ver que tanta gente ainda tem nostalgia de um tempo que, se tinha seu charme, já cumpriu seu papel.  A ênfase na possibilidade da guerra nuclear iminente, mostrada no filme, nos parece tão datada hoje...  E, no entanto, como era verdadeira lá.



quinta-feira, 18 de abril de 2013

HOJE

                                
Antonio Carlos Egypto





HOJE.  Brasil, 2011.  Direção: Tata Amaral.  Com Denise Fraga, Cesar Trancoso, João Baldasserini, Pedro Abhull, Lorena Lobato.  82 min.


O que sabemos sobre as pessoas que viveram a luta clandestina e armada de resistência à ditadura brasileira, no seu período mais tenebroso?   Que marcas a tortura deixou nas pessoas que sobreviveram?  E quanto aos desaparecidos?  Como ficaram as relações pessoais e familiares?  Qual foi o custo dessa história toda? São perguntas que remetem ao passado?  Segundo a diretora Tata Amaral, não.  Trata dessas pessoas hoje.  Daí o nome do filme.

Qual é o sofrimento que existe hoje?  O que fica entranhado na vida de alguém que foi torturado, resistiu heroicamente ou delatou, e sobreviveu?  E os filhos e companheiros ou companheiras que sumiram?  Porque é preciso abordar questões como essas, abrir a caixa-preta, na expressão de Denise Fraga, é que é muito oportuna a história contada em “Hoje”, com base em ótimo roteiro de Jean-Claude Bernardet, Rubens Rewald e Felipe Sholl, a partir do livro “Prova Contrária”, de Fernando Bonassi.




Vera, que já teve o codinome de Ana Maria, quando viveu em aparelhos clandestinos, interpretada por Denise Fraga, teve seu companheiro desaparecido: Luiz, ou Carlos, como codinome, o papel de Cesar Trancoso.  Quando Vera é reconhecida como viúva, obtém legalmente uma reparação em dinheiro, o que lhe permite ter, pela primeira vez na vida, um apartamento comprado a vista. Pode usufruir agora de algum conforto.  É o que se mostra nas características do velho mas espaçoso imóvel.  Vemos sua mudança, que decorre ao longo de todo o filme.

Com o apartamento, vêm as culpas, o medo da verdade, os fantasmas.  Eles sempre estiveram aí, estão aí, mas potencializados pela concretude da moradia, consequência trágica da perda.  Mas, e se o desaparecido aparecer de repente? 

Ao relatar essa história íntima, Tata Amaral põe Vera em contato com Luiz e também Ana Maria em contato com Carlos, enquanto os carregadores vão trazendo as caixas da mudança que terão de ser postas em algum lugar e abertas depois.  Clara metáfora das caixas-pretas que continuam por aí, esquecidas ou negadas.  Hoje elas parecem destinadas à Comissão da Verdade, enfim criada há um ano.  Mas pertencem a todos, a toda a nação.  Como é possível viver sem abri-las, organizá-las, dispor de seu conteúdo pela casa?  Mesmo que a caixa destinada à saleta vá parar no quarto, ou a do escritório fique na sala.  É fundamental abri-las, conhecê-las.




Denise Fraga é reconhecidamente uma das grandes atrizes brasileiras da atualidade.  Tão competente nos papéis cômicos, desenvolve aqui um papel dramático, trágico, cheio de nuances, sentimentos fortes abafados, ambiguidades.  Ela tem um admirável desempenho, que dá força e significado à temática que “Hoje” abraça.

Cesar Trancoso, o ator uruguaio, protagonizou “Infância Clandestina”, o filme argentino que representou a nação portenha na disputa do Oscar de filme estrangeiro.  Já havia participado, também, da divertida produção uruguaia e brasileira, “O Banheiro do Papa”.  É um excelente ator e também faz um belo trabalho.  Não deixa de ser curioso constatar a escolha de alguém de origem estrangeira e forte sotaque para viver um personagem que luta contra a ditadura brasileira.  Busca dar uma dimensão mais ampla, ultrapassar a própria realidade nacional?  Será uma forma de relacionar os dramas vividos por aqui com os da Argentina, Uruguai, Chile?  Uma alternativa para dar ao personagem a possibilidade de ter sumido do país?  Creio que tudo isso pode caber.  Faz sentido, pelo menos.




Tata Amaral escapa à situação teatral a que a história conduz, toda ela vivida num apartamento vazio, que vai sendo preenchido.   Ela se vale de projeções e de planos diversos, que sempre mostram o apartamento sob ângulos e aspectos diferentes.  Funciona bem.

“Hoje” foi o grande vencedor do Festival de Brasília de 2011, recebendo o prêmio da crítica de melhor filme e prêmios para atriz, fotografia, direção de arte e roteiro.



quinta-feira, 11 de abril de 2013

VOCÊS AINDA NÃO VIRAM NADA

                          
Antonio Carlos Egypto


VOCÊS AINDA NÃO VIRAM NADA (Vous N’Avez Encore Rien Vu).  França, 2012.  Direção: Alain Resnais.  Com: Sabine Azéma, Pierre Arditi, Mathieu Amalric, Michel Piccoli, Anne Consigny, Lambert Wilson, Hippolyte Girardot.  115 min.
Alain Resnais, um dos maiores cineastas de todos os tempos, segue não só vivo como muito ativo, com um novo filme na praça.  Desta vez é “Vocês Ainda Não Viram Nada”.  Um filme que homenageia o teatro, seus grandes textos, atores e atrizes.
A história começa com o aviso telefônico a grandes atores e atrizes da morte de um importante dramaturgo.  Cada um deles já encenou, em alguma versão, a peça “Eurídice”, que ele escreveu.  Devem se reunir em uma casa do autor teatral, para assistir à leitura de seu testamento, gravado em vídeo.
O pedido pos-mortem do dramaturgo é para que eles avaliem, com base em suas experiências anteriores com a peça, uma nova montagem de um grupo jovem, para aprová-la ou  não.  Essa circunstância faz com que Resnais reúna alguns grandes atores e atrizes, sem cenário ou figurino algum, e os faça representar belas passagens de textos muito bons.  Enquanto isso, cenas de uma montagem despojada, moderna, voltada ao social, são mostradas na tela, por meio de bons intérpretes, mas ainda em formação.Os veteranos relembram as cenas e como as fizeram no passado, recriam suas falas, entonações e sentimentos, ao ver a nova montagem.  A emoção vai se impondo e cada um deles tem uma nova e rica experiência, ao rememorar e reinterpretar o texto.
O que significa uma obra teatral densa e envolvente?  É algo de que não se esquece e que nunca perde o sentido.  Acompanha-nos por toda a vida.  Os atores e atrizes que a viveram no palco estarão marcados para sempre por aqueles personagens e suas falas mais destacadas.  É realmente uma bela homenagem ao fazer teatral o que Alain Resnais desenvolve aqui, no jogo da encenação atual e antiga, em que os veteranos, naturalmente, roubam a cena, sem precisar de adereço algum para isso.
Um grande ator, uma grande atriz, mesmo sozinhos num palco nu, enchem a cena.  É impressionante como isso se dá, é mágico.  Quem já viu Paulo Autran ou Fernanda Montenegro contando casos, sem nada a apoiá-los num palco, sabe do que se trata.  É algo intangível, uma experiência espiritual, talvez.  De qualquer modo, inesquecível.
Alain Resnais fala do impacto de uma grande peça em um momento da sua vida.  Comenta que, quando foi assistir à montagem de “Eurídice”, de Jean Anouilh, nos anos 1970, em Paris, ficou tão emocionado que teve de fazer um passeio de bicicleta pela cidade, para colocar seus pensamentos em ordem, e foi rever a peça na semana seguinte.  “Vocês Ainda Não Viram Nada” faz uma adaptação livre de “Eurídice” e “Cher Antoine”, do dramaturgo Anouilh.
As interpretações trazem Sabine Azéma e Pierre Arditi, colaboradores habituais do diretor, assim como Anne Consigny e outros.  Mas traz também Michel Piccoli, Mathieu Amalric, Lambert Wilson e Hyppolyte Girardot.  Uma lista de atores e atrizes brilhantes, que nos impacta ao longo de todo o filme.  Para fruir como quem come uma boa comida francesa, saboreando um bom vinho.  Aliás, Alain Resnais é como os bons vinhos, ao longo do tempo.  Mantém intactos seus dotes, quando não se supera.
  

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Vocês Ainda Não Viram Nada

Tatiana Babadobulos





Vocês Ainda Não Viram Nada (Vous N'Avez Encore Rien Vu) França, 2012. Direção: Alain Resnais. Roteiro: Alain Resnais e Laurent Herbiet. Com: Mathieu Amalric, Pierre Arditi, Sabine Azéma, Jean-Noël Brouté, Anne Consign, Hippolyte Girardot. 115 minutos



Aos 90 anos, o cineasta francês Alain Resnais continua em ótima forma. Depois de emplacar sucessos como “Hiroshima, Meu Amor” (1959), “O Ano Passado em Marienbad” (1961) e muitos outros, ele segue fazendo seus filmes periodicamente, e encantando a plateia.

Seu “Medos Privados em Lugares Públicos”, de 2006, ficou em cartaz no Brasil (ao menos em São Paulo, no antigo Cine Belas Artes) durante mais de um ano. Em 2009 foi a vez do polêmico “Ervas Daninhas”.

Agora, Resnais conta uma história sobre a morte. “Vocês Ainda Não Viram Nada” (“Vous N’Avez Encore Rien Vu”) começa com diálogos ao telefone de uma pessoa avisando aos demais sobre a morte de um amigo. O tal amigo é o famoso dramaturgo com o qual diversos atores (interpretando eles mesmos, ao menos nos nomes) trabalharam anteriormente.


O contato é feito para que esses atores se dirijam a uma casa no interior da França para que assistam à abertura do testamento que o tal dramaturgo deixou. Ao se encontrarem, os artistas assistem a um vídeo, elaborado pelo diretor antes de sua morte, com a encenação da peça de teatro “Eurídice” por jovens atores.



Os que estão assistindo ao vídeo se lembram das respectivas montagens das quais participaram anteriormente com o mesmo texto e seus personagens. Então, resolver proclamar, com saudade, os diálogos que costumavam dizer anos antes.

Em uma das passagens, um dos atores diz que “um pouco de amor, um pouco de dinheiro, um pouco de sucesso e a vida fica bela”. Tudo o que artistas como ele procuram na vida.

Alain Resnais brinca com a morte e, mais uma vez, trabalha ao lado de sua musa, Sabine Azéma. Desde 1983 eles trabalham juntos e esta é a nona vez.

“Vocês Ainda Não Viram Nada” foi selecionado para o Festival de Cannes. O longa tem seus momentos engraçados, mas também os emocionantes, já que estamos falando sobre a vida de uma pessoa que chegou ao fim enquanto limpava a arma de caça. Ainda que se saiba o final logo no início e a mistura de teatro com cinema seja desnecessário, Resnais não cansa nenhum cinéfilo que se preze. E, de quebra, ainda temos o desfile de ótimos atores interpretando personagens memoráveis.

terça-feira, 9 de abril de 2013

O DIA QUE DUROU 21 ANOS


                         
 Antonio Carlos Egypto



O DIA QUE DUROU 21 ANOS.  Brasil, 2012.  Direção: Camilo Tavares.  Documentário.  80 min.

31 de março/1º. de abril de 1964.  Um dia triste, guardado na memória.  Eu era um adolescente interessado em política, que procurava me informar do que estava acontecendo.  Acreditava que a reforma agrária era urgente para resolver muitos problemas do país.  E que as reformas de base que o presidente João Goulart pregava seriam um caminho na direção da justiça social e da modernização do Brasil.
O golpe de Estado que derrubou Jango foi uma sombra que escondeu a luz carregada de esperança daqueles dias.  Chamavam essas coisas de subversão, comunismo.  E o golpe, de revolução.  Acho que eles tinham um dicionário próprio, diferente do que eu costumava consultar lá em casa.

Quem poderia imaginar que esse dia triste duraria tantos anos e traria dias muito mais tristes pela frente?  O filme de Camilo Tavares já começa bem pelo título, muito feliz: “O Dia Que Durou 21 Anos”.  Ele nos mostra, didaticamente, o que foi esse longo e tenebroso período da ditadura, desencadeada e mantida pelos militares, mas que teve todo o apoio das elites da época, dos jornais, depois censurados, aos empresários que financiavam a repressão e até assistiam a torturas.
O mais importante, no entanto, do que o documentário focaliza, é mostrar de forma categórica que o golpe foi concebido, apoiado e financiado pelo governo dos Estados Unidos.  Aponta o papel fundamental do embaixador americano no Brasil, Lincoln Gordon, do envolvimento da CIA, da operação Brother Sam, que poderia promover uma invasão naval do Brasil por Santos, e do envolvimento direto dos presidentes democratas John Kennedy, assassinado em meio a esses fatos, e Lyndon Johnson.

Eu me lembro de uma matéria ampla, de capa, de uma revista que tinha prestígio naqueles dias, com a manchete cínica: “A nação que se salvou a si mesma”.  Agora temos a clareza de que todo o plano posto em prática foi rigorosamente executado tal como foi planejado na Casa Branca.  Está tudo bem documentado pelo filme de Camilo Tavares, cujos argumento e consultoria ficaram a cargo de seu pai, Flávio Tavares, um dos presos políticos trocados pelo embaixador americano sequestrado no Brasil, Charles Elbrick.  Esse episódio também está no filme e faz todo o sentido, depois do que se vê do espírito golpista do governo norte-americano daquele período, para defender a democracia (sic) dos riscos do comunismo e de uma nova Cuba, na América Latina.

Ao longo dos anos, as coisas acabaram não saindo como o planejado e até alguns dos maiores apoiadores iniciais locais optaram por publicar receitas de bolo, em lugar de notícias censuradas.  No exterior, eram frequentes as denúncias de violações de direitos humanos pelo regime autoritário brasileiro, que se eternizava no poder à força.  As sombras viraram trevas e foi preciso muito esforço, muita luta e negociação, para que acabássemos finalmente caindo numa democracia, sem aspas e sem ironia.
Lembrar essa história, ou conhecê-la, no caso dos mais jovens, é fundamental.  Daí a importância do documentário lançado agora nos cinemas.  Aliás, pessimamente lançado: em poucas salas e só em alguns horários.  Acabará levando pouca gente aos cinemas.  Quem não alcançar vê-lo agora, poderá encontrá-lo brevemente em DVD. Indispensável.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

FESTIVAL DO SESC MOSTRA OS MELHORES FILMES DE 2012


                                   
 Antonio Carlos Egypto



O 39º. Festival SESC 2013 Melhores Filmes, que se estende do dia 03 ao dia 25 de abril, exibirá em São Paulo, na capital e em mais 18 cidades do interior e do litoral, os filmes escolhidos pela crítica e pelo público como os melhores exibidos pelos cinemas, em 2012.  Só entraram na votação os filmes exibidos comercialmente pelos cinemas, em programação regular.  Ficaram de fora os festivais e mostras especiais, em que os filmes são exibidos em poucas sessões e horários e em locais específicos.

Serão apresentados nesse festival 40 filmes, sendo 23 estrangeiros e 17, nacionais, que foram os mais votados pela crítica e/ou pelo público.  É uma grande oportunidade para assistir ao que se perdeu, ao longo do ano passado, algumas vezes grandes filmes que ficaram muito pouco tempo em cartaz, pelo pequeno apelo comercial ou atropelados por blockbusters que tomam conta de um absurdo número de salas de cinema.  Alguns desses representantes do cinemão também estarão presentes no festival, já que costumam ter boa votação do público.  Também é uma chance de reavaliá-los.



Aproveito para declarar o meu voto como crítico para o 39 festival sesc melhores filmes:
Cinema brasileiro
Melhores filmes (ficção)
1 – ERA UMA VEZ EU, VERÔNICA
2 – XINGU
3 – LUZ NAS TREVAS – A VOLTA DO BANDIDO DA LUZ VERMELHA
4 – EU RECEBERIA AS PIORES NOTÍCIAS DE SEUS LINDOS LÁBIOS
5 – CARA OU COROA

Melhor documentário
A MÚSICA SEGUNDO TOM JOBIM

Melhor diretor
Nelson Pereira dos Santos e Dora Jobim, por “A Música Segundo Tom Jobim”

Melhor ator
João Miguel, por “Xingu” e “À Beira do Caminho”

Melhor atriz
Hermila Guedes, por “Era Uma Vez Eu, Verônica”

Melhor roteiro
Marcelo Machado e Di Moretti, por “Tropicália”

Melhor fotografia
Adriano Goldman, por “Xingu”



Cinema estrangeiro
Melhores filmes
1 – FAUSTO
2 – O MOINHO E A CRUZ
3 – A INVENÇÃO DE HUGO CABRET
4 – A SEPARAÇÃO
5 – MOONRISE KINGDOM

Melhor diretor
Alexander Sokurov, por “Fausto”

Melhor ator
Michael Fassbender, por “Shame”

Melhor atriz
Tilda Swinton, por “Precisamos Falar sobre o Kevin”



terça-feira, 2 de abril de 2013

Jack: O Caçador de Gigantes


Tatiana Babadobulos




Jack: O Caçador de Gigantes (Jack The Giant Slayer). Estados Unidos, 2013. Direção: Bryan Singer. Roteiro: Christopher McQuarrie e Dan Studney. Com: Nicholas Hoult, Eleanor Tomlinson, Stanley Tucci, Ian Mcshane, Bill Nighy, Ewan Mcgregor. 114 minutos.
 

Contos de fadas estão ganhando cada vez mais versões modernas nos cinemas. Recentemente, o clássico “Branca de Neve e os Sete Anões” (primeiro longa-metragem de animação, com direção de Walt Disney) estreou com Charlize Theron no papel da rainha má em “Branca de Neve e o Caçador”. Teve também “Espelho, Espelho Meu”, com Julia Roberts no papel da madrasta. Já Chapeuzinho Vermelho foi representada por Amanda Seyfried, em “A Garota da Capa Vermelha”.

Agora é a vez de “João Pé de Feijão” ganhar sua versão não apenas moderna, mas principalmente hi-tech, no longa dirigido por Bryan Singer (“X-Men”), “Jack: O Caçador de Gigantes” (“Jack The Giant Slayer”).

A essência do conto está todo lá: garoto plebeu recebe, como pagamento por seu cavalo, feijões mágicos e, quando a princesa do reino aparece em sua humilde casa, os feijões são molhados e os são levados para outro mundo.


A questão é como esta história clássica é contada na tela grande, em uma época na qual o fundo verde é frequentemente utilizado em Hollywood. Isso significa que a fita é praticamente toda feita com inserções digitais, de modo que os atores contracenam sozinhos e usando o que a imaginação mandar. Somente na pós-produção as imagens computadorizadas serão inseridas e a mágica será feita.

Não se trata, porém, de a utilização da tecnologia ser um problema no cinema. Ao contrário. Os longas de animação que são sucesso de público e crítica estão aí para mostrar o que o computador é capaz de fazer em benefício da história. Em filmes live action (com atores), a tecnologia é largamente utilizada com animações e também no uso da captação do movimento, que é quando o ator simula o movimento e chips são colocados em seu corpo para captar o movimento. Exemplos são os movimentos do ator Andy Serkis, responsável pela performance do Gollum, em “O Senhor dos Anéis”, e dos macacos, em “Planeta dos Macacos: A Origem”.


Neste ano, o Oscar de Melhor Filme e Melhor Diretor foi dado para o longa que mais utilizou animação em sua produção. “As Aventuras de Pi”, de Ang Lee, conta a história do garoto que precisa conviver com o tigre em alto mar e as cenas do animal são todas geradas por computador.

No caso de “Jack: O Caçador de Gigantes” aconteceu a mesma coisa. Jack (Nicholas Hoult, de “X-Men – Primeira Classe”), depois de conhecer e se apaixonar pela princesa Isabelle (Eleanor Tomlinson), precisa lutar contra os gigantes que encontra no outro mundo para se soltar e retornar. No meio do caminho, ele vai viver deliciosas aventuras, lutar contra guardas do palácio, como Elmont (Ewan McGregor, de "Guerra nas Estrelas"), que estão apenas interessados no dinheiro.

O filme traz ainda a versão 3D, que dá um toque de aventura a mais na projeção, que pode ser uma boa sessão da tarde.