terça-feira, 6 de janeiro de 2015

ACIMA DAS NUVENS


Antonio Carlos Egypto




ACIMA DAS NUVENS (Clouds of Sils Maria).  França, Suíça, 2014.  Direção e roteiro: Olivier Assayas.  Com Juliette Binoche, Kristen Stewart, Chloë Grace Moretz, Lars Eldinger.  123 min.


“Acima das Nuvens”, com roteiro e direção de Olivier Assayas, é um filme que apresenta uma narrativa muito bem estruturada no paralelismo de uma atriz que se prepara para refazer uma peça em que brilhou no passado, em novo papel, que reflete, repercute e modifica a relação dela com sua assistente.  Na vida como na peça.

Os diálogos são tão bem construídos que em boa parte das cenas não se consegue distinguir claramente se eles se referem a um trecho da peça ou à relação presente que estamos vendo.  Se é ficção, ensaio da peça, ou realidade, a relação que se dá entre a atriz e a assistente.




Se a peça original falava de uma relação amorosa entre duas mulheres a partir de um contexto profissional, o que assistimos acontecer agora é, a rigor, a mesma coisa.  O substrato do conflito é também o mesmo: a passagem do tempo, a diferença de idade e as características de ambas, que criam o contexto no qual a mais nova domina a relação e subjuga, de algum modo, a mais velha.

A personagem jovem na peça é Sigrid, que foi vivida no esplendor dos vinte anos de idade por Maria Enders (Juliette Binoche), atriz respeitada e consagrada.  Hoje, caberia a ela o papel da mais velha, Helena, que sente a passagem do tempo e é a que sofre a dominação da outra.  Um desafio e tanto, porque a faz conviver com seus medos e fantasmas.  Que se materializam na peça por uma nova Sigrid, a atriz Jo-Ann Elis (Chloë Grace Moretz), jovem audaciosa e amante de polêmicas.  E, ao mesmo tempo, podem se encontrar em Valentine (Kristen Stewart), a jovem assistente, viva, inteligente e objeto de desejo não explicitado.



Se o autor da peça envelhece e morre, sendo objeto de homenagens, o diretor teatral é jovem, talentoso e ambicioso.  Quer Maria Enders para viver Helena, depois de ter vivido Sigrid: um atrativo a mais para a montagem.  A personalidade e a notoriedade da atriz que fará a nova Sigrid garante o restante da publicidade.

O dilema de Maria Enders, em meio às montanhas suíças de Sils Maria, são o centro e a razão de ser da trama, magnificamente costurada.  O clima de ansiedade, tensão, desejo e hesitação que povoam a personagem são vividos com grande competência e sutileza por Juliette Binoche.  Pelas mãos hábeis de Olivier Assayas, o filme transmite a verdade psíquica de uma personagem rica, complexa e cheia de conflitos.  Fala-se de uma relação amorosa que oscila entre a repressão dos sentimentos e desejos e a disputa pelo poder.  Ou melhor, de duas situações similares, que ocorrem simultaneamente.  De amores adultos entre mulheres e do que o tempo significa para cada uma.



Valentine, em bom desempenho de Kristen Stewart, faz o contraponto perfeito para a grande atriz madura.  Chloë Grace Moretz tem a força e a vitalidade necessárias na representação de Jo-Ann Elis, a que será a nova Sigrid.  O jogo de cena entre as três principais personagens, três mulheres fortes, prende a atenção do espectador todo o tempo.  Há suspense e revelações à espreita.  A dubiedade que vive a personagem de Juliette Binoche nos envolve de tal modo que nos sentimos enredados na sua história.

“Acima das Nuvens” foi exibido na 38ª. Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro último.  Foi um dos melhores títulos ali apresentados.  Não cheguei a incluí-lo na minha lista dos melhores do evento porque só o vi agora.  Um grande filme, em todos os sentidos

  

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